23 de ago. de 2015

Vamos Juntas? | Entrevista com a criadora do projeto que incentiva mulheres a andarem juntas e se protegerem em situação de risco


Ah facebook, como gostamos de você! Não só pelo seu entretenimento que nos faz ficar horas e mais horas em frente a uma tela mas porque aproxima pessoas. Melhor, aproxima histórias! E o Vamos Juntas? é prova disso. 


Com o objetivo de conscientizar o público feminino de sua força, o movimento Vamos Juntas? incentiva mulheres a se acompanharem em ambientes que ofereçam riscos. Quantas vezes você que lê esse artigo agora já não se sentiu desamparada ao andar a noite pelas ruas voltando do trabalho ou faculdade?! Bom, nem eu e menos ainda você somos as únicas a se sentirem assim. O curioso é que em nosso bairro, no serviço ou até mesmo no transporte que utiliza há pessoas com os mesmos receios, então, por que não vamos juntas? 




Imagem: Divulgação



O blog Perdi a Chave procurou a idealizadora desse projeto, Babi Souza - jovem jornalista de 25 anos, residente no Rio Grande do Sul e que além de ter criado essa lindeza que mostra como a união nos faz mais forte, ainda foi extremamente simpática ao responder essa entrevista - para uma conversa. 

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Confira a entrevista exclusiva:


PERDI A CHAVE: Andar acompanhada já é até prática comum entre as mulheres, porém, muitas vezes, de forma inconsciente. Como foi a criação do “Vamos Juntas?”? Houve alguma vivência pessoal que desencadeou na idealização do projeto?

BABI SOUZA: O movimento começou, de fato, no dia 30 de julho, mas digamos que a sementinha dele, dentro de mim, germinava há algum tempo. Sempre fui vista como uma jornalista idealista que tem o sonho de mudar o mundo, e realmente tenho. Não que eu tenha a megalomania de achar que o mundo não viveria sem mim e tal, mas acho que tenho a responsabilidade de "mudar" o MEU mundo e o mundo a minha volta, como acho que deveria pensar qualquer cidadão. Nesse sentido, vinha pensando muito sobre a relevância que eu tinha, não tanto como jornalista, mas principalmente como ser humano. Foi quando comecei a estudar e pesquisar sobre colaborativismo e empreendedorismo social. Entrei em contato com a incrível ideia de que as pessoas têm o poder de melhorar as suas vidas através da união e que juntos podemos mais e somos mais felizes. A velha ideia de que a união faz a força e de que ao invés de reclamar dos poderes, devemos nos propor, juntos, a deixar o nosso mundo um pouquinho melhor.

Como já estava em contato com essa forma de ver o mundo, o movimento surgiu como solução colaborativa para um problema real que passamos todos os dias. Tive o estalo no caminho de volta para casa me sentindo insegura por passar pelo centro de POA à noite. Convidei a Vika Schimitz (que hoje é designer do movimento) para montarmos um card (texto em imagem) explicando qual seria a ideia do movimento. A ideia era postar apenas nas minhas redes sociais para contar a ideia para as minhas amigas mas a repercussão foi tanta que em menos de duas horas pessoas de fora do meu circulo de amizade estavam compartilhando a imagem e perguntando se tínhamos página, aí que criamos ela.


PERDI A CHAVE: São 57 mil curtidas (Até o momento da entrevista. Hoje já conta com mais de 120 mil curtidas) na fanpage oficial em menos de um mês. Você acredita que tal desenvolvimento seja reflexo de um medo que, infelizmente, já é parte do cotidiano feminino? Como é pra ti lidar com as vozes de tantas mulheres que se fazem presente a partir das postagens do “Vamos Juntas?”?

BABI SOUZA: É incrivelmente emocionante receber tantos relatos de mulheres desconhecidas. Quase que posso ouvir dentro de mim uma voz que diz "sim, aquilo que as pessoas falam sobre a desunião das mulheres é mentira". Primeiro porque elas confiam e acreditam na gente para contar sua história que às vezes nunca tiveram coragem de falar para ninguém e segundo porque a grande maioria delas contam ocasiões em que mulheres Se uniram e juntas foram mais tranquilas e felizes. Muitas têm me adicionado no face, inclusive, apenas para agradecer. É muito emocionante. Posso ver um sinal de que o futuro do mundo realmente é mais bondoso e colaborativo.

PERDI A CHAVE:   “Não eduque suas meninas para se protegerem, mas sim, seus meninos para as respeitarem”. Pensando nisso, como é a participação do público masculino com a página e com a ideia de acompanhamento a mulheres?

BABI SOUZA: Dá para sentir que eles têm bastante dificuldade de entender como nos sentimos na rua, mas temos recebido muitas mensagens deles. Algumas no sentido de “nossa, não entendi direito pra que serve o movimento” e outras no sentido de “obrigada por terem criado esse movimento, me sinto preocupado pela minha namorada/irmã/mãe”. Uma vez compartilhamos na página a frase “Só as mulheres entendem o alívio de olhar para trás na rua e ver que a pessoa que está caminhando atrás de você é outra mulher.” e um homem comentou “Não são só vocês, a gente também sente isso”.

PERDI A CHAVE:  Mesmo ainda sendo recente o “Vamos Juntas?” possui um cunho sólido de conscientização para a segurança pública. Além dos usuários das redes sociais, o projeto já angariou algum apoio de entidades públicas? Quais são os planos para o futuro?

BABI SOUZA: Algumas prefeituras têm nos procurado com a ideia de difundir a ideia em suas cidades e nós apoiamos isso. Também tem meninas e (e até um menino) que pediram permissão para colocar cartazes do VJ? Em suas escolas. <3

PERDI A CHAVE:  A internet é objeto presente na vida de grande parte dos moradores de grandes cidades. A seu ver, qual é o papel dessas ferramentas (mídias sociais) para ações que beneficiam a mulher e a sociedade? Já houve muitas criticas ao “Vamos Juntas?” e, se sim, como você reage diante delas?

BABI SOUZA: Não tivemos muitas críticas, não. Apenas alguns homens que não entendem porque ele existe e outras mulheres que dizem se negar a confiar em outras mulheres na rua. Sobre a internet, acho que o movimento é uma prova de que ela é uma ferramenta mobilização incrível com um poder enorme quando falamos de um assunto relevante para as pessoas.


PERDI A CHAVE:  Para encerrar, deixe seu recado às leitoras (e leitores) do Perdi a Chave.

BABI SOUZA: Convido todas a se unirem umas às outras e a acreditarem na sororidade. Se tiver dúvidas sobre se ela realmente existe, visitem a página e tenham a prova de que nossa união é possível, sim. <3



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Veja algumas das histórias enviadas para o "Vamos Juntas?"

ENTREVISTA | Vamos Juntas?
Imagem: Divulgação


Em um mundo ideal não precisaríamos andar juntas para nos proteger, tal ação seria somente um ato de coleguismo ou amizade. Infelizmente, a violência contra a mulher aumenta cada vez mais. Em 2014, foram registrados cerca de 50 mil casos de estupro no território nacional, número que passa distante do real pois há muitos casos que não chegam nem a ser denunciados e, portanto, não entram nos dados estatísticos.  Ações como a da Babi Souza nos mostram que podemos sim nos proteger, olhar para a garota ao nosso lado e identificar que o medo dela também pode ser o nosso e que, consequentemente, a força dela em enfrentar também pode ser a nossa. 

Conheça essa ideia na fanpage oficial clicando aqui , conte sua história, conheça muitas outras e compartilhe essa ideia com suas amigas, colegas ou até mesmo com desconhecidas que encontrar em seu caminho. 





23 de jul. de 2015

TEATRO | sobre a tara que veste corpo in cena


Essa semana surgiu em meus feeds um texto publicado no Jovem Online intitulado "É verdade que atores e atrizes precisam ficar pelados na faculdade de artes cênicas?" e, ao republica-lo em minha timeline, gerou divergentes e interessantes reflexões.

Primeira situação: você não terá que ficar nu quando estudar artes cênicas. Claro, é aconselhável ingressar carregando em si um espírito livre que te permita vivenciar diferentes linguagens artísticas-teatrais as quais, uma delas, pode utilizar a nudez. Mas a arte como um todo é extremamente abrangente. Uma carreira é delineada antes de mais nada pelo próprio artista, pois antes de ser ator/atriz você é um humano que tem dentro de si indagações, limites, receios e propósitos e eis o que há de mais belo na arte: a humanidade

Outro aspecto a ser refletido é essa ânsia de realizar peças teatrais com nudez - mesmo que o que vá ser produzido não tenha originalmente o elemento do nu. Há um pensamento comum de transgressão, de quebra de paradigmas quando a nudez é empregada - Infelizmente, é comum assistir peças fracas no que diz respeito a conceito e até mesmo atuação, que se destacam somente pela falta de roupa - e por tantas tentativas de encontrar esse diferencial acaba-se criando mais do mesmo. Não é o propósito aqui debater a qualidade de peças ou grupos (cada um tem sua proposta artística, sua linguagem, e todas merecem ser respeitadas), mas já é comum ver peças de baixa qualidade que se destacam apenas pelo nu. O corpo por si só é apenas uma página em branco a ser delineada e construída transformando-se assim em arte.

O nu pelo nu pode sim ter um conceito: a naturalidade! A sociedade ainda carrega consigo tabus desnecessários quanto a visibilidade do corpo - contraditoriamente, pois o corpo já é objeto de vitrines televisivas, comum aos olhos até dos mais conservadores - e, quando usado como estudo pode sim ser interessante. Mas para tal é necessário acabar com as grandiosas manchetes que anunciam "peça com cenas sexualmente explicitas" ou "grupo apresenta peça com nudez"

E até mesmo modificar o pensamento daqueles que atuam pois se é pra ser natural, a nudez deveria ser trabalhada com o olhar de alguém que sai do banho numa boa pois ali é uma cena comum de nudez cotidiana e não como algo que por obrigatoriedade o ator deveria alcançar em palco. Nada de errado na proposta de causar o espanto, questionamentos e concepções referente a nudez, é levantando tabus que levamos o próximo a reflexão. Mas é também glorificando tabus que o alimentamos para continuar assim sendo. Tudo é uma questão de proposta, não tem certo ou errado, mas tem antes de tudo um pensar.
A nudez é sim um objeto rico da arte, mas o material humano mais valioso no teatro é ainda o que vem de dentro. A pele é um figurino único, exclusivo que pode nos levar além - como humanos, atores, personagens - mas é apenas uma parte do que nos compõe. O corpo, a arte, a essência do artista vai mais além do que a exposição de seu corpo, esta é mais inerente a alma

E para complementar segue um poema de Eduardo Dias que surgiu dessa prosa boa que sem querer as redes sociais nos promoveu:
sobre a tara
que veste
corpo
in cena.
peito
sem roupa
é facil,
quero ver
coração nu
(ainda que)
vestido.
(sobre fetiches e fantoches)

imagem: Folha | UOL 

24 de jan. de 2015

Centro de SP: sobre amor, andarilhos e aquilo que se vê


Há algo de único no Centro de São Paulo. Talvez seja somente uma visão exagerada de quem cresceu lendo crônicas de jornalistas boêmios e que, por influência, ache os ares dessas ruas acinzentadas um tanto especial.

Andar me faz bem. Sempre me fez bem! E mesmo quando eu já estou bem, andar me faz mais bem. E andar pelo Centro então...nem se fala! Quantas vezes sai da Vergueiro, peguei a Paulista inteira, desci aquela Consolação desértica de transeuntes, dando voltas na Praça Roosevelt, seguindo pela Ipiranga e caminhando até a escadaria do Municipal (e parando por lá, claro! As pernas uma hora precisam descansar). São sei lá quantos quilômetros e sei menos ainda quanto tempo esse trajeto leva, não sinto o tempo, não sinto o corpo, não sinto. E o não sentir, nesse aspecto, é a sensação mais prazerosa do mundo. Catártico.


FOTO: TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO 

E lá, já no Municipal fico a olhar. De dia, aquela balburdia que chega a bagunçar os sentidos: artistas de rua, amplificadores em portas de lojas, gente se trombando, aquela pesquisadora chata que teima atrapalhar o seu sossego a lhe encher de perguntas sobre consumo e afins. De noite aquele marasmo: a van policial (que ótimo), alguns bêbados cambaleando pelas calçadas e sumindo ao longe, casais de mãos dadas flertando e outros, mais intensos, se esquentando em toques e beijos, alguns mais solitários (Presente!rs Sempre só estou eu e meus pensamentos). Por falar em mim, olho cada um e penso que com eles passam histórias, tento decifrar em suas faces carrancudas, alegres, despojadas, indiferentes, etc, aquilo que eles possam ter vivido antes de estar ali. Assim como eu, depois de caminhar por muito tempo até lá chegar, parei ali com uma história, uma expressão, uma vida.


Faço isso desde, sei lá, dezessete anos de idade, onde saia das salas de concerto, das aulas musicais, para assim ficar. Andava esses caminhos de forma mais leve, tinha sim pesos carregados de outrora que eu fingia não estar ali mas que sempre carreguei, mas os passos eram menos difíceis e a respiração mais leve. O tempo passa (ohh se passa!) mas há aquilo que fica, um hábito, um pensar, um viver, um olhar. A cidade de SP assim como o mundo que se vive (Seja esse que se habita, seja aquele que se cria, seja aquele que só existe para nós pelo simples e puro destino) está aí como cenário de histórias, de anônimas histórias.